Silêncio. Transfobia. Pessoas trans. Análise do discurso. Foucault.
O presente trabalho tem como objetivo analisar as faces do silêncio que ecoam nas existências trans no contexto sócio-organizacional e como as pessoas trans reagem a fim de combater desafios, impasses e possíveis transfobias. De modo a ampliar o escopo da pesquisa e desmembrá-lo em práticas pontuais, especificamente, delinearam-se os seguintes objetivos específicos: 1) analisar as construções discursivas de pessoas trans, a fim de identificar indícios de silêncios e transfobias vivenciadas no contexto social, hétero-cis-normativo, a partir dos padrões de gênero, sexualidade e corporalidade; 2) analisar as construções discursivas de pessoas trans, a fim de identificar indícios de silêncios e transfobias vivenciadas no contexto das instituições Família, Escola, Igreja e Estado; 3) analisar políticas e práticas organizacionais que visam normalizar e organizar comportamentos do trabalhador, a partir do enunciado de pessoas trans, a fim de identificar indícios de silêncios e transfobias; 4) analisar o enunciado de pessoas trans acerca da diversidade, tendo em vista a responsabilidade social das organizações, a fim de identificar indícios de silêncios e transfobias; e 5) apreender como pessoas trans apropriam-se do silêncio, (re)existem, resistem e revigoram-se no contexto sócio-organizacional, a fim de combater desafios, impasses e possíveis atos transfóbicos. Parte-se do pressuposto que silêncios e transfobias se apresentam em faces que ecoam nas pessoas trans – travestis, transexuais e transgêneros – com efeitos diversos no contexto sócio-organizacional, hostil e pouco inclusivo. Entretanto, é intrigante saber que há carência de estudos e de pesquisadores que se debruçam sobre a temática. Nas pesquisas realizadas, não foi encontrado estudo amplo que faça o diálogo das faces do silêncio com as transfobias vivenciadas por pessoas trans no contexto sócio-organizacional, explorando questões como os feixes de poder que perpassam as narrativas organizacionais hegemônicas, de modo a compreender como as pessoas trans reagem frente a esses desafios impostos. Os Estudos Organizacionais não podem silenciar essa questão. Sendo assim, optou-se por uma abordagem queer e pós-estruturalista crítica, ao desfazer o olhar funcional que normatiza comportamentos e condutas nas organizações, além de produzir verdades sobre perspectivas excludentes. Como operacionalização da pesquisa, optou-se pela abordagem qualitativa, com a realização de 23 entrevistas semiestruturadas em profundidade, analisadas sob pressupostos da análise do discurso de Foucault, em diálogo com outros autores queer e pós-estruturalistas, como Butler, Louro e Miskolci, entre outros que dialogam com essas questões no campo dos Estudos Organizacionais. A escolha dos(as) participantes se deu segundo a construção da rede de colaboração voluntária com a pesquisa, por meio da abordagem da bola de neve. Os resultados da pesquisa indicam que há indícios de silêncios e transfobias vivenciadas por pessoas trans que, no contexto social, hétero-cis-normativo, sob influência das instituições Família, Escola, Igreja e Estado, moldam, por meio de dispositivos de poder e saber, os padrões de gênero, sexualidade e corporalidade a serem seguidos e, no contexto organizacional, atuam a partir de políticas e práticas organizacionais que silenciam as pessoas trans no trabalho ao negar a diferença, não valorizando as suas existências. Com isso, as práticas da diversidade nas organizações nem sempre ocorrem de modo incrustado à responsabilidade social, devido à instrumentalização do seu cunho social. Considerando as barreiras que são impostas e que impedem o reconhecimento das pessoas trans no contexto sócio-organizacional, o silêncio representou, para elas, possibilidade para (re)existir, resistir e revigorar-se nesse contexto a fim de combater desafios. A passagem do silêncio para a voz é também aliada nessa luta por novas agendas sócio-organizacionais. Desse modo, esta pesquisa contribuiu para questões práticas, sociais, culturais, acadêmicas e metodológicas ganharem novas traduções na contemporaneidade. Abrem-se novos caminhos para quebrar o ciclo de invisibilidade e silêncio em torno das pessoas trans.